segunda-feira, 8 de abril de 2013

Carta a Psicoterapeuta.

Como de costume, sempre chego atrasada no seu consultório. Não por que acontecem coisas no percurso, mesmo que eu viva inventando desculpas pra você, pra justificar meus atrasos. É por que eu fico pensando demasiadamente em não ir até aí. Seu telefone toca a cada 5 minutos, e mesmo eu na poltrona com pernas de índio, consigo notar seu movimento nada discreto pra desviar a ligação e continuar a nossa consulta. Melhorei, tô mais atenta, mas pra você, continuo intransponível. Ainda nesses 8 anos, eu sou intransponível. Hoje você me questionou sobre a morte.Das flores, das folhas no quintal do seu consultório, dos meus papéis amassados. Hoje você me questionou sobre a morte do amor, e principalmente dos meus cadernos cheios de parágrafos. Hoje, você me questionou sobre a morte de pessoas queridas, principalmente delas. Você: "O luto é um estado natural". Eu: "Mas eles já morreram a muito tempo!". Você: "Sua mãe disse que você está doando uma série de coisas que te fazem lembrar deles, e até coisas deles." Eu: "Sim, tudo em perfeitas condições." "Mas pode ser perturbador. Você tem a sentir-se?",você disse. "Mas, o que? O que eu tenho a sentir? As pessoas não pensam mais, elas sentem. "Como se sente?" -"Não me sinto confortável" - "Nós do grupo sentimos muito". Por favor!! Sabe, um dos maiores problemas da nossa era é que nós somos governados por quem liga mais para sentimentos do que para pensamentos e idéias. Isso sim, me interessa. Pergunte no que estou pensando. Você diz: "No que você está pensando, Mariz?" Os pensamentos se tornam palavras. Cuidado com as palavras, elas se tornam ações. Cuidado com ações, elas se tornam hábitos. Cuidado com seus hábitos, eles se tornam seu caráter. E cuidado com o seu caráter, ele se torna seu destino. Nós nos tornamos o que pensamos, meu pai vive me dizendo isso. E eu acho que eu estou bem. Mas agradeço a sua preocupação!", finalizei. E pela primeira vez nesses oito anos, você com os olhos marejados me disse: "Eu que te agradeço", e se pois a chorar. E eu me pus a chorar junto de você, mesmo sem entender ou compreender o por que. Mas é melhor continuar sem entender, por que o seu telefone toca. Deve ser alguém precisando da tua ajuda, ou alguém querendo te dar colo.