terça-feira, 18 de setembro de 2012

O Riso é perigoso.

Clarice Lispector beliscava sua amiga Lygia Fagundes Telles quando entravam juntas num encontro literário: – Não ri, vai! Séria, cara de viúva. – Por quê? – perguntava Lygia. – Para que valorizem o nosso trabalho. Não há mesmo imagem de alguma risada da escritora Clarice Lispector. Em livros e revistas, a cena que persiste é seu olhar desafiador, emoldurado por um rosto anguloso, compenetrado e enigmático. Os lábios não se mexem, absolutamente contraídos, envelopes fechados para a posteridade. Lispector não mostrava suas obturações, sua arcada para ninguém. Não se permitia gargalhadas para não parecer mulher superficial e leviana. Ela percebeu que existe um imenso preconceito contra a alegria. Os críticos não a levariam a sério, dizendo que ela não era densa, não inspirava profundidade; acabariam por sobrepor a aparência faceira aos questionamentos metafísicos de sua obra. Seu medo não era bobo. O riso permanece perigoso. Todos temem os contentes. Falam mal dos contentes. O riso gera inveja, ciúme, intriga: “Por que está feliz, e eu não?”. A alegria é malvista em casa e no trabalho, sempre intrusa, sempre suspeita equivocada de uma ironia ou de um sentimento de superioridade. Ainda acredito que profissionalismo é feição fechada, casmurra. Ainda deduzo que competência é baixar a cabeça e não entregar nossas emoções. Quanto mais triste, mais confiável. Quanto mais calado, mais concentrado. O que é um tremendo engano. A criatividade chama a brincadeira, assim como a risada renova a disposição. Se um funcionário ri no ambiente profissional, o chefe deduz que ele está vadiando, sem nada para fazer. Poderá receber reprimenda pública e o dobro de tarefas. Quem diz que ele não está somente satisfeito com os resultados? Se sua companhia ri durante a transa, você conclui que está debochando do seu desempenho. Quem diz que não é o contrário, que ela não festeja o próprio prazer? Se a criança ri no meio da aula, o professor compreende como provocação e pede para que cale a boca. Quem diz que ela não está comemorando algum aprendizado tardio? Se o filho ri quando os pais descrevem dificuldades profissionais, a atitude é reduzida a um grave desrespeito. Quem diz que ele não achou graça do tom repetitivo das histórias? Se a namorada ou namorado ri e suspira à toa, já tememos infidelidade. O riso é escravo dos costumes, sinônimo de futilidade e distração quando deveria ser visto como sinal de maturidade e envolvimento afetivo. Não reagimos bem à felicidade do outro simplesmente porque ela ameaça nossa tristeza.

Traduzindo a alma feminina

Mulheres têm um idioma todo particular. Elas falam duas coisas ao mesmo tempo. São várias expressões que não podem ser compreendidas ao pé da letra. Apresentam um sentido totalmente diferente daquilo que até eu mesma pensava. Não sou nenhum Chico Buarque, nem um Teixeirinha, mas vou me arriscar a traduzir a alma feminina para prevenir separações mundo a fora. Quando a mulher diz "vamos sair um pouco!" significa "eu quero mudar de canal, não agüento mais futebol!" Quando a mulher diz "estou depilada" significa que está a fim de sexo. Quando a mulher diz "só nove minutinhos" significa "duas horas e um minutinho". Quando a mulher diz "estou irritada" significa que ela está maluca. Quando a mulher diz "tenho dor de cabeça" significa "me deixa quieta!" Quando a mulher diz "você não presta" significa "eu te amo apesar de tudo". Quando a mulher diz "cala a boca" significa que você não sabe ouvir. Quando a mulher pergunta "tem alguma coisa na geladeira?" significa "me leve para jantar fora!" (ela sabe que não tem nada) Quando a mulher diz "não é necessário, amor" significa "é muito importante, amor". Quando a mulher diz "você não me entende" significa que você não faz o que ela quer. Quando a mulher diz que está indecisa numa loja significa um pedido para você comprar a peça e dar de presente. Quando a mulher diz “pode ir sozinho” significa “me leva junto, por favor”. Quando a mulher diz pode atender ao telefone no meio de um filme significa “desligue o celular, pô!”. Quando a mulher diz “amanhã” significa nunca. Quando a mulher diz “hoje” significa ontem. Quando a mulher diz "vamos dormir" significa dormir mesmo.

Venha, por favor!

Eu espero alguém que não desista de mim mesmo quando já não tem interesse. Espero alguém que não me torture com promessas de envelhecer comigo, que realmente envelheça comigo. Espero alguém que se orgulhe do que escrevo, que me faça ser mais amiga dos meus amigos e mais irmã dos meus irmãos. Espero alguém que não tenha medo do escândalo, mas tenha medo da indiferença. Espero alguém que ponha bilhetinhos dentro daqueles livros que ela tem certeza que vou ler até o fim. Espero alguém que se arrependa rápido de suas grosserias e me perdoe sem querer. Espero alguém que me avise que estou repetindo a roupa na semana. Espero alguém que nunca desista de conversar mesmo quando não sei mais falar. Espero alguém que, nos jantares entre os amigos, dispute comigo para contar primeiro como nos conhecemos. Espero alguém que goste de dirigir para nos revezarmos em longas viagens. Espero alguém que confie se a porta está fechada e o café desligado, se meu rosto está aborrecido ou esperançoso. Espero alguém que prove que amar não é contrato, que o amor não termina com nossos erros. Espero alguém que não se irrite com a minha ansiedade. Espero alguém que possa criar toda uma linguagem cifrada para que ninguém nos recrimine. Espero alguém que arrume ingressos de teatro de repente, que me sequestre ao cinema, que cheire meu corpo suado como se ainda fosse perfume. Espero alguém que não largue as mãos dadas nem para coçar o rosto. Espero alguém que me olhe demoradamente quando estou distraído, que goste de me telefonar para narrar como foi seu dia. Espero alguém que procure um espaço acolchoado em meu peito quando cansada. Espero alguém que minta que cozinha e só diga a verdade depois que comi. Espero alguém que leia uma notícia, veja que haverá um show da minha banda predileta, e corra para me adiantar por e-mail. Espero alguém que fique me chamando para dormir, que fique me chamando para despertar, que não precise me chamar para amar. Espero alguém com uma vocação pela metade, uma frustração antiga, um desejo de ser algo que não se cumpriu, uma melancolia discreta, para nunca ser prepotente. Espero alguém que tenha uma risada tão bonita que terei sempre vontade de ser engraçada. Espero alguém que comente sua dor com respeito e ouça minha dor com interesse. Espero alguém que prepare minha festa de aniversário em segredo e crie conspiração dos amigos para me ajudar. Espero alguém que pinte o muro onde passo, que não se perturbe com o que as pessoas pensam a nosso respeito. Espero alguém que vire cínica no desespero e doce na tristeza. Espero alguém que goste de domingo em casa, de acordar tarde e de andar descalça, e que me pergunte o tempo antes de olhar para as janelas. Espero alguém que me ensine a me amar porque a separação apenas vem me ensinando a me destruir. Espero alguém que tenha pressa de mim, vontade de mim, que chegue logo, que apareça hoje, que largue o casaco no sofá e não seja educada a ponto de estendê-lo no cabide. Espero encontrar uma mulher que me torne novamente necessária.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Detalhes me interessam!

E se eu falar que o seu braço sobre o meu ombro naquela conversa fez toda a diferença? Gosto de iniciativa. Parceria. Eu abro a porta, você puxa a cadeira, eu chamo o garçom, você. A sua ligação no meio da tarde de quarta, seus rabiscos no bloquinho verde limão, o chocolate no futebol, o seu sms quinta de madrugada, onde leio você elogiando a noite anterior e um alerta de futuros reencontros. Esses detalhes me deixam com vontade de. Você verbaliza, pontua, exclama, apaixona, presenteia (com palavras) e embriaga da forma que gosto. Sou grata a todos os santos por isso. Pego o terço bento que minha amiga me entregou e mando ver nos agradecimentos. Eu acredito. Naquela noite, entre nossos amigos em comum eu te olhava com admiração enquanto você articulava sobre os exercícios que aprendeu em uma aula de terça. Você faz isso direitinho, tem um certo ar arrogante e seguro enquanto fala, existe um certo charme enquanto passa a língua nos lábios e arruma o cabelo. Deve ser de Marte. E quando eles voltam a conversar entre si, o meu olhar mira o seu e o seu olhar flerta com o meu. E quase podemos decifrar o que se passa na mente de ambos. Essa atmosfera tem gosto de mel. Cheiro de baunilha. Cor de tulipa vermelha. E você ri enquanto imagina o que eu posso tá imaginando pelas minhas caras e bocas. Deixo um tanto da minha coragem para enfrentar os futuros imbróglios. Sim, eles surgirão, como já surgirão e dessa vez farei diferente, prometo pra você não fugir no primeiro tropeço ou me enrolar. Deixo reservado para você uma dose de humor para quando o seu estiver escasso. Naqueles dias em que as coisas no trabalho não fluem, ou quando aquela dorzinha de cabeça resiste a qualquer Coca-Cola com aspirina. Deixo as dúvidas e os medos lá atrás, em um lugar distante, onde não me alcancem. Deixo em cima da mesa dois convites do show que vai ter no final desse mês na cidade. Você olha, arruma novamente o cabelo, molha os lábios com a língua e me entrega de graça o que eu mais gosto em você: seu sorriso.

domingo, 9 de setembro de 2012

Domingo Particular.

Tenho em mim uma agonia insidiosa e malandra. Quando me pega distraída, fica me soprando aos ouvidos frases que incitam pressa. ‘Vai. Liga pra ele outra vez’; ‘Anda, pergunta pra chefe se o trabalho ficou bom’; ‘Briga com seus amigos por não terem te procurado no fim de semana’... Diante dessa agonia libidinosamente nociva, me perco feito criança em labirinto. Eu ligo, cobro, corro, choro, brigo. Tudo antes da segunda página. Acaba que as outras pessoas mal desenharam o primeiro parágrafo e eu já terminei o texto. Intensidade é pouco. Vou engolindo as entrelinhas, os arremates floreados, as frases lustradas. Meus amores são rascunhos escritos em papel de fazer origami. Começam dizendo como foi bom conhecê-lo, e terminam na dor de cotovelo de um final mal resolvido. Pois é... Tudo culpa dessa agonia penosa. Ela tem desejos alvoroçados, e uma pressa enorme de ser feliz... Fica recitando versinhos e me cobrando amar. Cantarola músicas doces e me pergunta quando é que a felicidade vem. Eu não sei. Olha aqui, sua agonia filha da puta, eu não sei! E já cansei de procurar debaixo de cada pedra, em cada fresta, em todos os vãos. Eu não procuro mais! E aí encaro a agonia, abro bem os olhos e digo com todas as letras: ‘Agora quero paz. A felicidade que me procure quando estiver pronta pra mim!’. Vá eu querer entender a cabeça alheia (só agora começo a entender a minha, aos trancos e barrancos). A velha história das borboletas de Quintana é tão real quanto a inconstância que nos cerca, mesmo que ninguém admita. Não vou prometer não ligar. Não vou jurar que ‘já foi’, nem esnobar, nem fingir que não me importo. Sou muito mais que isso... Sim! Eu me importo, dane-se. Hoje vou tentar deixar de lado o tsunami de descontentamento que me segue feito quimera... Decidi que é domingo. Meu domingo particular... As preocupações vão ficar pra depois, feito vendedor batendo na porta em pleno fim de semana pela manhã... A gente se revira na cama, e simplesmente ignora... Hoje é domingo! Já li todos os livros da estante, a tv não tem nada que valha minha atenção, e por mais que revire a agenda, ninguém merece um telefonema ou convite pra passeio no parque. Tudo bem, isso é típico dos domingos. Dias assim não são especiais nem são tristes. São preguiçosamente vazios. A gente vai empurrando os problemas com a barriga... Deixa pra amanhã! Aliás, já chega de divagar... Hoje é domingo. Vou procurar desenho nas nuvens ou dormir no sofá... Amanhã decido se me curo ou enlouqueço.